terça-feira, 9 de março de 2021

REMINISCÊNCIAS E ESCRIVIVÊNCIA

 

 

             Carrego em mim a doce lembrança de minha avó materna que me criou. Ela partiu cedo desta vida, mas me deixou de herança seu amor e os melhores fios que me tecem. Quando menina, costumava cumprir um ritual de adoração: toda vez que ia à praia, trazia um baldinho com água do mar para banhá-la na nossa banheira. Eu aspergia as gotas da água do mar sobre o seu corpo como que reverenciando à Rainha das águas. Minhas referências sincretizadas, Oxum, Nossa Senhora da Conceição, minha avó as representava todas numa só carne. Na minha imaginação, essa água era benta e a imantava com a minha gratidão e desejo que vivesse para sempre!

 

            Cubro-me com essa espécie de parangolé, colcha de retalhos formada dos pedaços de memória rebelde, que se recusam a ir embora. Trago em mim a rebelião contra o mito freudiano de Édipo. Componho-me da ancestralidade das Deusas, mulheres que fizeram parte da minha vida e colorem minha pele de muitos tons.

             Recuso-me a crescer! Quero manter a eterna criança que deseja poesia que me provoca e desafia. Pois, crescer é perder a poesia. Talvez por isso, nós adoecemos à medida que nos afastamos da infância e da poesia consequentemente. Através da poesia, desapego desse ser doentio, apático e repetitivo, apartado da dúvida e da criatividade. Questiono os podres poderes e não me encaixo nos moldes. Não sirvo a esses senhores, não sou escrava do sistema capitalista! Reciclo todas as representações e me reinvento, buscando novos caminhos coados do peso da culpa.

            

             Todas as mulheres encerram em si canções de rebelião que pendem para um lado ou outro das questões que marcam a nossa sociedade partida por clamores de liberdade. Estou possuída, incorporada da revolta no melhor sentido nietzschiano, preciso matar aquilo que me mata! Grito por todas as mulheres com a esquizofrenia militante, sou filha de uma feminista, da revolução contra a ditadura, da fome por justiça e igualdade! Espero que esta saga feminina ancestral me inspire a levar avante o grito pela libertação das correntes. O peso das responsabilidades não me tira o ânimo. Alcanço a leveza através do amor que incinera a covardia.

 

             O conto de Conceição Evaristo desagua meus olhos que se sensibilizaram ao passearam pelo Quarto de Despejo de Carolina de Jesus. A realidade das mulheres que se repete no cotidiano de uma população que vive o preconceito em especial às mulheres negras e pobres como no relato da jornalista Bianca Santana do movimento Não me Khalo. Daí das alturas onde as minhas ancestrais vivem agora, podem ver o meu esforço para não esquecer das minhas origens.

 

            Caso me fosse dada a possibilidade de voltar a viver, eu aceitaria de bom grado revistar todas as dores e delícias. “Quero isto ainda uma vez e inúmeras vezes”. Sou os muitos livros que li, as bênçãos, rezas, pajelanças, dívidas, dúvidas e dádivas que contraí. Sou feita de sustos, soluços, lágrimas, gargalhadas, bem-queiranças. Confesso que vivi, lembranças das andanças, muito mais das esperanças, divididas com quem convivi. Trago em mim a fome de vida dos refugiados da inquisição, que alcançaram o exílio nas terras tupiniquins em busca da liberdade de professar as suas crenças. Por que se mata em nome de Deus? Não encontro resposta para essa iniquidade. Lembrar convoca a dubiedade do amargo remédio: o veneno, é também o antídoto. O que não me mata, me fortalece como falava Nietzsche. Assim, fico em paz, mas com o rebuliço das reminiscências da minha escrivivência!


Nathalia Leão Garcia

Rio de Janeiro, 09 de março de 2021.




quarta-feira, 6 de maio de 2020

ODE AO AMOR NA PANDEMIA




Meu amor para celebrar o calendário
Nesses dias onde perdemos as chaves
Vamos nos vestindo de luz
Pra comemorar o seu aniversário
São bodas de álcool gel e glória a Jesus.

Lembrando os sonhos partilhados
A esperança de tempos melhores nos traduz
Soltando vozes suaves  
Em alegro vivato canto
Acordes ora agudos ora graves
Matizes em impressos pontilhados

Surpreendidos pelo espanto
Sublimes e sobressaltados
Com apetites vorazes
Nos 5 anos imprevisíveis e memoráveis.

Na corda bamba dependurados
Como equilibristas do turismo
Seguimos por caminhos desmesurados
Bailamos na beira do abismo
Em saltos mortais sem rede de proteção
Nos entregamos ao feroz escapismo
Burlamos as regras da direção

A besta fera faminta
Segrega, isola e promove a sabotagem
E nós resistimos à sanha indistinta

Sobrevoamos o bosque selvagem
Nos pintando com variada tinta.
Cores de Picasso, Dalí, Miró, Caravaggio, Michelangelo.
Camuflados com as máscaras de cinismo.
Travamos batalhas e atravessamos o gelo.

Não sabemos os códigos desta seita
Tentamos manter a resistência
Andamos no escuro em miragens
Nos alimentando da essência
Pela precariedade da vida estreita
Que nos exige cultivar a paciência.

Somos passageiros à paisana
O inimigo letal nos espreita
Desafiamos a ira insana
Sobrevivemos por resiliência
Não sabemos dos códigos dessa esfinge estranha
Apenas nos oferecemos ao ofício.

Preparamos a ceia sem indulgência
Voltaremos marcados para o início
Ultrapassando a saga profana
Beberemos da seiva sagrada
Onde a vida retornará
E a fraternidade será consagrada.

Dedicado ao Alexandre meu amor no dia do seu aniversário de 43 anos. 
Estamos há 50 dias de quarentena.

Nathalia Leão Garcia

Rio de Janeiro, 06 de maio de 2020.


 
Live at Pompeii - Pompeia, Itália - maio/2016 


                                              
6 de maio de 2016 - Sagrada Familia -Barcelona, Espanha

 


                                                       

terça-feira, 7 de abril de 2020

THE SILENT VOID




To face the inexorable and brutal existential emptiness
I look around and see everything I have achieved,
the family I have built.
These are my foundations.
I'm not saying that I don't fall apart sometimes,
but a spark of hope rescues me.
I don't give up and I'm resilient.
I face my demons writing.
I´ve already crossed many chasms,
living on the edge one day at a time.
I balance between movement and meditation.
Only one word devours me,
the one that my heart didn´t say.

Nathalia Leão Garcia
April 7th, 2020



segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Análise Crítica de Discurso - novelas e séries O BEM AMADO, aproximando o cotidiano da sala de aula.


Análise de novelas e séries: aproximando o cotidiano da sala de aula.

Introdução

            A cena escolhida refere-se a um discurso de campanha política e é parte da novela O Bem-Amado de 1973 da TV Globo, baseada no livro homônimo escrito por Dias Gomes em 1962 e alcançou grande audiência e popularidade, sendo a primeira novela colorida da história. O estilo de farsa política driblava a censura da época da ditadura para tratar no fundo de um assunto sério: a política sem escrúpulos, truculenta e corrompida dos coronéis “donos do poder” da época.  É de se destacar o tom jocoso do discurso do Coronel Odorico Paraguaçu que se candidata a Prefeitura da cidade fictícia de Sucupira na Bahia, tendo como plataforma política a construção de um cemitério na cidade, já que os defuntos eram enterrados na cidade vizinha. O rico e poderoso Odorico descobriu uma forma de chegar ao cargo público e se beneficiar com a construção do cemitério em Sucupira, usando de todos os meios, lícitos e ilícitos para alcançar seu objetivo. Este excerto da obra ganha importância para a discussão em sala de aula por demonstrar claramente o poder exercido pelo personagem principal Odorico Paraguaçu sobre o povo da cidade, caracterizando uma hegemonia, termo do filósofo marxista Antonio Gramsci, que se refere ao “domínio exercido pelo poder de um grupo sobre os demais, baseado mais no consenso do que no uso da força” (RESENDE; RAMALHO, 2009, p.43).
Apresentação
          Link da cena (https://www.youtube.com/watch?v=0huzZXT-n_g)
          A cena do discurso de Odorico em campanha para Prefeito, que se dá num palanque montado na praça da pequena cidade encontramos uma fala teatral “afetada”, grandiloquente, teatral, verborrágica, rebuscada, sendo muitas vezes vazia em termos de conteúdo, procura seduzir os incautos eleitores. A posição do palanque demonstra a dominação do povo: os poderosos da cidade em cima e o povo embaixo.
          Transcrição dos diálogos da cena analisada:
Odorico (em altos brados, gesticulando): Meus conterrâneos de Sucupira! Essa cidade num pode continuar nessa situação! (pausa para aplausos e apoio da população)
Povo: Gritos de apoio, todos ovacionando e aplaudindo Odorico, exceto um personagem de braços cruzados, calado e sério logo na frente da multidão, o Nezinho do Jegue.
Odorico (continua no mesmo tom alto no palanque): Na atual cunjuntura:: a gente tem que fazê o cimitério municipal:::!
Povo: É :::: (Todos gritando e aplaudindo animadamente)
Dorotéia Cajazeira (professora, vereadora e apoiadora da campanha de Odorico e está na comitiva no palanque): Uma cidade que não respeita os seus mortos, não pode ser respeitada pelos vivos! (Em tom alto de advertência)
Odorico: Pego daí:::
Povo: É:::: (Todos gritando, amontoados em trajes sumários) Por traz do povo, vai passando um cortejo fúnebre, levando um defunto carregado para outra cidade a pé.
Odorico: É incrivi:: que essa cidade mui justamente chamada:, apelidada: e porque não dizê: cognonimada::” a pérola do norti”!::: que é o orgulho do estado da Bahia:::
Povo: É:::( povo grita e bate palmas)
Odorico: pela boniteza: da sua paisagi:: pelo arejamento e porque não dizê:: pela frescura do seu clima!:::
Análise do diálogo
          A partir da análise do diálogo travado pelo candidato Odorico em seu discurso de campanha, o povo reunido na praça da cidade e a apoiadora política professora Dorotéia, vemos pares de adjacência que se alternam numa “conversa fictícia” onde os turnos são negociados na fala-em-interação conforme os estudos de Dick Allwright ( 1980). A agenda do Coronel Odorico estabelece a intenção pré determinada de reforço da sua hegemonia a partir da negociação da conversa consentida pelos atores fazendo a manutenção de agendas interacionais por meio da seguinte estrutura de turnos:
1ª. fala: Odorico, o candidato, toma um turno e dá início a uma interação dirigindo-se ao povo em discurso.
2ª. fala: O povo insere um turno durante o turno de Odorico interrompendo no intuito de expressar a sua aprovação, demonstrando a hegemonia representada pela aceitação do poder exercido pelo Coronel como parte da liderança política e econômica da cidade.
3ª. fala: Odorico, toma um turno novamente, e prossegue na sua interação dirigida ao povo.
4ª. fala: O povo insere um turno durante o turno de Odorico, encorajando e apoiando-o.
5ª. fala: Dorotéia insere um turno  e complementa a fala no turno de Odorico dirigindo-se ao povo.
6ª. fala: Odorico aceita um turno respondendo a fala de Dorotéia.
7ª. fala: O povo insere um turno interrompendo o turno de Odorico, aplaudindo e apoiando-o.
8ª. fala: Odorico toma um turno e continua seu discurso verborrágico.
9ª. fala: O povo insere um turno, interrompendo o discurso após a pausa de Odorico, aplaudindo-o calorosamente.
10ª. fala: Odorico toma um turno novamente e continua seu discurso cheio de neologismos, marcado pela linguagem regional nordestina e usando PNP ( português não padrão). Encerra-se a cena.
Análise das categorias plásticas do plano de expressão
      Como proposto no enunciado do presente trabalho, usamos a semiótica greimasiana. A cena da novela O Bem Amado apresenta além do texto escrito manifesto pelo discurso falado também o texto visual que ajuda a compor  o sentido.  Para analisar as relações estabelecidas entre os diferentes elementos visuais que compõe o texto da cena em questão e para entender o percurso de produção de sentido, partiremos das considerações sobre as categorias eidética, topológica e cromática da semiótica greimasiana.
      Observando a forma de construção dos diferentes figuras do discurso, vemos que o cenário é composto por duas formas de categoria eidética:
1-      As figuras dos personagens que estão no palanque que representam a classe dominante incluindo o candidato Odorico e seus apoiadores políticos que usam trajes mais elegantes.
2-      As figuras do povo que ocupam o plano mais baixo, sem proteção do sol e que assistem ao discurso, manifestando-se através das saudações de apoio ou como o Nezinho do Jegue que fica de braços cruzados, sério só escutando e analisando. O povo se diferencia dos membros da elite por seus trajes mais despojados onde os mais jovens, em especial as mulheres usam pouca roupa e expõe mais os corpos.
O sentido que é sugerido de assimetria dos dois grupos, acesso a expressão e influência, uso de trajes diferenciados. O povo se opõe aos políticos na forma de se vestir e apresentar.

    Na categoria topológica vemos que as figuras estão dispostas em dois planos delimitados, alto e baixo. O plano alto no palanque é ocupado pela elite social e o povo está situado no plano baixo. O sentido sugerido reforça a assimetria dois grupos que se relacionam da seguinte forma: os que mandam no alto e os que obedecem embaixo, demonstrando como a hierarquia se faz presente no texto.

       Na categoria cromática observa-se uma cidade ensolarada típica do Nordeste com cores quentes predominantes. Odorico se diferencia dos demais personagens pelo uso de terno e pela escolha da cor branca. Há a sugestão de sentido de distinção entre o personagem principal e o povo em geral ressaltando o seu destaque em relação aos demais. A rima de cores sugere o branco como relacionado ao poder versus outras cores para os que não detém o poder.
             
Conclusão

             A utilização de textos multimodais em sala de aula traz a possibilidade ao professor de elaborar roteiros críticos. O gênero novela televisiva proporciona a aplicação da metodologia crítica na análise tríplice ou tridimensional, em que as dimensões de prática social (ideologia, hegemonia), prática discursiva (produção, distribuição, consumo) e prática textual são analisadas simultaneamente.  Este texto escrito por Dias Gomes foi adaptado para vários gêneros como livro, peças, novelas de TV, séries, filmes na utilização dos conceitos básicos ainda presentes na realidade socioeconômica e política brasileira.
             Abordando a constituição do personagem principal, Odorico Paraguaçu, a partir de seus possíveis ethé, verifica-se que estes estão relacionados aos imaginários sócio-discursivos da época em que a novela foi produzida e ainda se verificam atuais. Com isso, percebe-se que na produção recorreu-se aos imaginários políticos, para idealizar o personagem, aludindo aos políticos e situações políticas do período (anos 70 – ditadura militar). Os principais imaginários seriam do político coronel, e o imaginário do político verborrágico, que ajudam a construir o ethos do personagem. De acordo com a releitura do teórico Maingueneau (2004, p. 98- 99), o ethos é como um fiador do que é dito em um discurso, uma espécie de voz que não está explícita no enunciado e por isso mesmo é eficaz. As ideologias( “verdades”) são explicitadas através da caricatura do coronel que usa expressões próprias neologismos e palavras rebuscadas( ex: cognominada, cunjuntura), usa de alianças e tramóias para alcançar seus objetivos, onde os fins justificam os meios, máxima maquiavélica. Seu caráter duvidoso, traições e uso de dinheiro público para se locupletar são apresentados em tom humorístico como uma farsa para burlar a censura aos meios de comunicação vigente. O alcance ( distribuição) encontram o veículo da TV para se espalharem pelos lares de todo o país. Os demais personagens representam assim: o povo na sua sabedoria popular, a imprensa ( dita “marronzista” por Odorico) contrária  ao Coronel, a polícia que representa a lei que se filia à política e ao povo na garantia da ordem, as amantes de Odorico membros da fina flor da sociedade, Zeca Diabo o justiceiro convertido por “Padre Cícero” que acaba matando o coronel no fim tragicômico, Odorico por ironia acaba inaugurando o Cemitério Municipal, o Nezinho do Jegue que ora apóia Odorico e quando bebe o achincalha e outros personagens do povo típico de cidade do interior do Nordeste. A prática social do político corrupto que usa o cargo para enriquecer e favorecer seus protegidos é legitimada pela posição do povo, imprensa opositora, polícia, críticos e bajuladores que mantém o equilíbrio instável dessas forças ora se opõe ora se juntam no contexto da luta hegemônica no Brasil. A dominação é garantida pela identidade legitimadora do político sobre o povo que o elege e perpetua a sua ação de controle e autoridade. O texto semiótico em todas as suas dimensões trabalha a conscientização de que os cidadãos são responsáveis pelas mudanças sociais através de seu posicionamento crítico. A intenção é desconstruir a tradição brasileira de país colonizado pelo europeu em que se espera que “o pai” resolva os problemas e a adoção de uma postura ativa de construção de identidades e transformações sociopolíticas.
            
Referências:

As estratégias políticas de O Bem Amado, farsa sociopolítica. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/bitstream/1843/MGSS-A7PR8Q/1/disserta__o_vers_o_definitiva_da_definitiva__1__revista_el_.pdf Acesso em: 6 nov. 2019.

BATISTA JÚNIOR, José Ribamar Lopes; SATO, Denise Tamaê Borges; MELO, Iran Ferreira de. (org.). Análise de discurso crítica para linguístas e não linguístas. São Paulo: Parábola Editorial, 2018.

Cena da novela O Bem Amado (1973) - O discurso de Odorico para prefeito. Disponível em:   https://www.youtube.com/watch?time_continue=2&v=0huzZXT-n_g Acesso em: 4 nov. 2019.

FAIRCLOUGH, Norman. Discurso e mudança social. Brasília: Universidade de Brasília, 2001.

GEISEL, Claudia Cristina Mendes. E-book Análise do Discurso, 2019. Disponível em:  ead.uva.br/filemanager/file/documentos/EBOOK/ADD_ebook.pdf

 

Linguagem e discurso. Elementos de Semiolinguística. Disponível em:   https://www.academia.edu/5911357/Linguagem_e_Discurso_-_Charaudeau Acesso em 7 nov. 2019.
O livro O Bem-Amado de Dias Gomes. Disponível em:  https://www.culturagenial.com/livro-o-bem-amado-dias-gomes/  Acesso em: 5 nov. 2019.
         
RESENDE, V. M; RAMALHO, V. Análise do discurso crítica. São Paulo: Contexto, 2007.(Disponível na Biblioteca Virtual)

http://televisao.uol.com.br/noticias/redacao/2013/01/18/escrita-por-comunista-o-bem-amado-teve-37-capitulos-retalhados-pela-censura.htm


quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

DENIED SOUL


I keep in my soul
words forgotten by time.
But time brings calm
and I resist.

Words that I invent,
remnant of the spreading kiss
I insist.
Mismatch of desires
and I went
I flow into torrent foul

The star map to find meant
it's made of sleeping dreams
Don´t really exist
Living in the far reaches of the sea
cradle of the lost ship
welcomed in the silence mist
that lies in the moonlight´s beast

I keep in my soul
words forgotten by time.
But time brings calm
and I resist.

Reality wreck my illusions
Torture thought abuseful
Turn it into plesant lyes
I wanted to get the poems out of hiding eyes.

The songs to fall asleep people so aimful
Bring out the clearful
light portals of painful
disillusionment
in prayers contained in the future hardful.

I keep in my soul
words forgotten by time.
But time brings calm
and I resist.

Nathalia Leão Garcia
January 15th, 2020.



terça-feira, 7 de janeiro de 2020

RELÍQUIAS DA ALMA


Guardo na alma
palavras esquecidas pelo tempo.
Mas o tempo traz a calma
e eu resisto com palavras que invento,
resquício do beijo que se espalma
desencontro de desejos como passatempo
deságua em torrentes desalma

O mapa de estrelas para me achar
é feito de sonhos maldormidos
que vivem nos confins do mar
berço dos navios perdidos
acolhidos no silêncio que jaz ao luar


Quisera tirar os poemas da clandestinidade
as canções para adormecer os humanos
Trazer a tona toda a claridade
portais de luz e desenganos
em orações contidas na eternidade.



Rio, 7 de janeiro de 2020.
Nathalia Leão Garcia


quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

GRACILIANO RAMOS: A LITERATURA COMO ESPAÇO DO IMAGINÁRIO E DA CRÍTICA DA SOCIEDADE



 
O presente trabalho pretende discutir o enraizamento do Modernismo no Brasil e sua vertente Regionalista, segunda fase do Modernismo que se diferenciam através dos contrastes na forma de suas narrativas. Tomando como base de análise o livro Vidas Secas de Graciliano Ramos, discorremos sobre os aspectos da narrativa que representam a “Geração de 30” ou “Neo – Realista”.  O Regionalismo trouxe as ambiguidades entre tradição e inovação além de expor de forma crítica as mazelas de regiões desprestigiadas do nosso país com as estórias realistas das pessoas simples que habitavam os Nordeste e Minas Gerais através de uma fala áspera que reproduzia com tonalidades diversas a estética Naturalista do fim do séc. XIX e suas manifestações na sociedade dos anos 1930. Já o Neo-Realismo foi um movimento artístico do séc. XX, marcado por um idealismo de esquerda, influenciado pela doutrina de Karl Marx trazendo à tona as lutas de classes. No Brasil este movimento recuperou elementos Realistas e Naturalistas, adotando práticas modernistas, marxistas e da Psicanálise de Freud. A Literatura Neo Realista é representada na obra Graciliano Ramos que preserva o determinismo social e psíquico, a perspectiva imparcial e um olhar objetivo e também as comparações entre seres humanos e animais. Graciliano Ramos nasceu em 1892 numa cidade do interior de Alagoas, primogênito de 16 filhos numa família que vivia as agruras das secas no sertão nordestino, marcado pela violência e pela personalidade dura de seus pais, interessou-se desde cedo pela temática agreste, seus problemas sociais e a análise crítica das relações humanas. Teve uma boa educação que o instigou o amor pelas letras, trabalhou como jornalista, funcionário público, encarregado de educação, chegou a política como Prefeito da cidade de Palmeira dos índios em Alagoas, numa trajetória heterodoxa e que desafia as convenções vigentes. Por assumir a militância política contrária ao Governo Vargas, é preso em março de 1936 sendo acusado de conspiração e participação nas revoltas comunistas de 1935, dessa experiência ficam as impressões escritas em “Memórias do Cárcere” que foi adaptado para o cinema também. Mais tarde viaja pelo leste europeu e filia-se ao Partido Comunista.  Considerado como o escritor de maior expressão da Geração de 30, com a sua literatura que denunciava as desigualdades e as arbitrariedades dos “donos do poder”: governo, polícia, os proprietários de terras que representavam a classe mais prestigiada da sociedade e a sua opressão sobre o povo que não dominava a língua portuguesa padrão e por sua ignorância era facilmente controlado pelo Estado.
Vidas Secas escrita em 1938, em plena concordância com a Geração de 30 e o Neo-Realismo, aborda temas como injustiça social, miséria, fome e seca dos nordestinos na sua saga de retirantes, numa forma pessimista e determinista em 13 capítulos fragmentados que podem ser lidos em qualquer ordem, representando uma ruptura com a linearidade temporal numa linguagem seca e impessoal da narrativa em terceira pessoa, econômica suprime advérbios e adjetivos, trazendo embutida uma crítica social contundente.  O livro explana a realidade brutal e inexorável da vida de uma família de retirantes da seca com uma visão animalizada dos seus personagens Fabiano, Sinhá Vitória, os filhos mais velho e mais novo além da cadela Baleia que esta sim parece mais humana e traz a parte mais emocionante da estória que ganha enorme empatia do público com suas ideias, pensamentos e reflexões na descrição detalhada de sua morte trágica dolorosa e impactante.  A narrativa evidencia a opressão e a violência dos agentes do poder: o patrão-dono da propriedade, o governo autoritário, a polícia arbitrária que representa a lei e a seca que é um personagem onipotente. O pai Fabiano é bastante brutalizado numa alusão naturalista e dominado por vícios como a bebida e os jogos. Os personagens seguem numa vida acomodada, conformando-se com as condições impostas determinantes do seu destino, sem esperanças ou reflexões filosóficas acerca da sua realidade.
O Regionalismo da obra Vidas Secas nos incita a indagar acerca das modalidades de relações entre esses sistemas culturais regionais e a literatura brasileira em questão.  Pela leitura dos excertos no artigo de Arruda, Modernismo e Regionalismo no Brasil: entre inovação e tradição, vemos a existência de uma descentralização da cultura que” resultou da própria formação do país, uma vez que a dispersão geográfica da atividade econômica produziu a tendência ao caráter independente das regiões; à perda de dinamismo corresponde “um lento processo de atrofiamento” que se constitui a dinâmica mesma “de formação do que no século XIX viria a ser o sistema econômico do Nordeste brasileiro [...]. A estagnação da produção açucareira não criou a necessidade – como ocorreria nas Antilhas – de emigração do excedente da população livre formado pelo crescimento vegetativo desta” (Furtado, 1963, pp. 79-80).
”No Brasil não se deu o movimento da substituição da atividade dominante, ou do aprofundamento da regionalização de forma a estabelecer as bases futuras de outros países, como foi o caso da América espanhola.” (Idem, p. 104) “Essas distintas regiões viviam independentemente e tenderiam provavelmente a desenvolver-se, num regime de subsistência, sem vínculos de solidariedade econômica que as articulassem. (Idem, p. 96)
Na articulação entre discurso do Regionalismo com as suas tradições que traz um olhar crítico de resistência, vemos as contradições da sociedade da época marcada pela diversidade, os nuances da rebeldia e busca por inovações do Modernismo da primeira fase centrado no eixo urbano Rio-São Paulo. Deixo aqui o questionamento sobre como o determinismo das condições adversas somado a uma política educacional equivocada que preferiu manter uma aparência de hegemonia na identidade nacional. A estética do Regionalismo da Geração de 30 escancara a desigualdade no processo de modernização do Estado Brasileiro. Através da dificuldade no acesso ao letramento encontra-se uma forma de impedir a libertação e independência do povo que assim poderia manter-se dominado para sempre.  As raízes da submissão se encontram nessa ideia de largar os desvalidos relegados a própria sorte, independentes e desarticulados. O pensamento dominante infundido era de que forte mesmo é o que sobrevive às condições adversas e mantém-se acomodado e dominável o que vigora infelizmente até hoje, perpetuando a visão pessimista trágica e imutável dos deserdados, excluídos e sujeitos ao preconceito como explanado pelo personagem Fabiano nas suas rasas divagações.

Referências:

ARRUDA, M. A. N. Modernismo e regionalismo no Brasil: entre inovação e tradição. Tempo social. São Paulo, v. 23, n. 2, p. 191-212, 2011. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-20702011000200008&script=sci_abstract&tlng=pt.
Acesso em: 4 nov. 2019.

BRUNACCI, M. I. Graciliano Ramos: um escritor personagem. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. Biblioteca Virtual.


Escritores de Neo-Realismo. Disponível em: https://www.infoescola.com/literatura/escritores-do-neo-realismo/  Acesso em: 5 nov. 2019.
Realidade e representação no romance regionalista brasileiro: tradição e atualidade. Disponível em: http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/o_eixo_ea_roda/article/view/5908 Acesso em: 4 nov. 2019.

Resenha – Vidas Secas – Graciliano Ramos. Disponível em: https://atraidospelaleitura.wordpress.com/2018/06/15/resenha-vidas-secas-graciliano-ramos/   Acesso em: 4 nov. 2019.

Vidas Secas – Graciliano Ramos. Vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=TlIGsVYCO0I  Acesso em: 4 nov. 2019.

Retirantes -  Cândido Portinari



REMINISCÊNCIAS E ESCRIVIVÊNCIA

                 Carrego em mim a doce lembrança de minha avó materna que me criou. Ela partiu cedo desta vida, mas me deixou de herança s...